Imagens fotográficas que, através do tempo, foram sendo encontradas, umas quase perdidas outras abandonadas, outras não...

sexta-feira, 26 de março de 2010

SUPPLEMENTO AO Nº 14 DO
PAE PAULINO
(GRATIS PARA OS ASSIGNANTES)
PONTE METALLICA D. FERNANDO SOBREO DOURO
ENGENHEIROS, EMPREZARIOS E CONSTRUCTORES
GUSTAVO EIFFEL & Cª.




Porto, 4 de Novembro de 1877

Semilhante na grandeza ao Arco da Alliança que atravessa o espaço em dias de tempestade, o prodigio do saber humano acaba de alevantar d’uma á outra margem do nosso formoso Douro, esse passadiço enorme que vai ligar as terras e os povos no grandioso abraço do progresso.
Despovoam-se as cidades e as villas para assistir á grande festa.
As locomotivas rasgam os espessos pinheiraes, e atravessam as duras entranhas da terra, para conduzir á cidade laboriosa os convivas que hão-de assistir ao baptismo da grande obra.
Coalha-se o rio de barcos. E os escarpados rochedos que outr’ora soffreram os tremendos abalos da artilheria, cobrem-se hoje com as bandeiras da festa.
Confundem-se no claro azul do espaço os gritos do enthusiasmo.
São pequenos de mais os peitos para conter os corações jubilosos.
As mãos rijas e calosas dos operarios, acabam de depôr os malhos que ajudaram a erigir o monumento.
As intelligencias repouzam depois da grande fadiga.
O ministro de Deus, abençôa; o Rei, contempla; e o povo, admira.
Quasi que se envergonha a natureza !...
O Porto junta hoje á sua historia a mais gloriosa pagina da sua vida.
Salvè, ó cidade invicta! Salvè !


___________


Damos em seguida a descripção minuciosa d’esta obra gigantesca, que está attestando quanto pode a tenacidade dos homens sinceramente devotados ao engrandecimento de paiz:



DISPOSIÇÃO GERAL



Esta ponte é formada por um grande taboleiro de 354,m375 de comprido, dividido em tres grandes porções tendo o taboleiro lateral (da parte da cidade) 132,m700; o central 51,m480; o da parte da Serra 170,m075; o que falta para preencher o total do comprimento do taboleiro vae nos dous intervallos que há entre elles, de 0,60 cada um; attendendo á dilatação do ferro.
Toda esta massa enorme formada por elegantes e solidas cruzetas, de St. Andre, de ferro batido, assenta sobre um systema mixto de cinco pilares em tudo identicos ao systema do taboleiro, e em um immenso arco que tem 160 metros de luz, 62 de altura desde a superficie do rio, na occasião da maré baixa, até ao seu extradorso, com nais dous pilares sobre si, um de cada lado.
Partindo do porto, a distancia entre o estrbo e o eixo do primeiro pilar é de 36,m875; d’aqui ao eixo do segundo 37,m375; ao do terceiro 28,m750. Aqui findam os pilares da parte do Porto; e o taboleiro vae firmar-se na parte superior do arco á distancia de 28,m750; seguem-se 52 metros em que o extra-dorso do arco se liga intimamente com o taboleiro; tendo uns 10 metros em que o proprio arco serve de leito á via; continua o taboleiro na extenção de 28,m750 até ao eixo do rimeiro pilar da parte da Serra, d’aqui ao eixo seguinte há um espaço de 28,m750, d’aqui ao terceiro pilar 37,m375; d’este ao do quarto 37,m375, e finalmente d’aqui até ao estribo do lado da Serra 36,m875.
A nascença do arco que tem 15 metros de largura apoia-se sobre fortissimos encontros de alvenaria á altura e 13,m88 isto é: 1,m270 mais elevado do que o ponto onde chegaram as águas do Douro na cheia de 1860. A altura dos cinco pilares é de 35,m970 para o primeiro, indo da cidade: de 42,m935 para o segundo; 42,m935 para o terceiro; 29,m006 para o quarto; e 15,m078 para o quinto
Os dous mais altos medem na base 11,m0 sobre 4,m80 e na parte superior 3,m095 sobre 3,m010. Ha ainda um varandim de resguardo que corre dos lados e ao longo do tabuleiro, havendo de um ao outro 4,m500



MONTAGEM



Se a concepção d’esta obra gigantesca e por todos os motivos digna das attenções dos homens mais distinctos na materia, é verdadeiramente assombrosa e admiravel, não o é menos a montagem que em tudo se apartou de antiga rotina, impraticavel n’este caso, por innumeras rasões; e seguiu um systema inteiramente novo.
Feitos os fundamentos de alvenaria e assentes sobre elles os pilares, construiu-se o taboleiro, principiando estes trabalhos simultaneamente do lado do Porto e da Serra.
Collocada a primeira parte sobre ao primeiros pilares ahi ficou assente sobre um maquinismo proprio para o ajudar a correr logo que houvesse montada maior porção, e assim successivamente até que, passando sobre os dous grandes pilares chegou ao ponto em que devia collocar-se o seguinte pilar sobre o arco.
Aqui cessou a montagem do taboleiro para principiar a do arco.
Nos primeiros lanços foi facil o trabalho. Mas logo que excedeu uma certa extenção o centro de gravidade cahindo muito fóra da base, obrigou a usar de cabos e escoras para o sustentar na posição conveniente. Á medida que os trabalhos augmentavam assim appareciam as difficuldades, mas por forma se houveram os distinctos engenheiros a quem foi commettida tamanha empreza, que conseguitam supperal-as: suspendendo toda aquella molle immensa por meio de cabos de aço que prendiam a parte construida do arco á parte superior dos pilares e ao taboleiro, que foi convenientemente preparado a fim de que não cedesse ao peso.
E, segundo este meio tanto mais difficil de pôr em pratica quanto mais avançavam as obras, assim chegaram a fechar a parte inferior do arco; e em seguida a parte superior.
Logo continuou a montagem do taboleiro e a dos pilares sobre o arco, fazendo aquelle assim que foi possivel, até que no dia 28 de Outubro correu até ao ponto em que devia ficar diffinitivamente.
Seguiu-se-lhe a collocação do varandim e depois o assentamento da via, e ligaram os dous extremos do fio telegrafico.



EXPERIENCIAS



No dia 30 de outubro teve lugar a primeira experiencia.
Duas maquinas chegaram até ao sitio do terceiro pilar, recuando em seguida para engatar uns vagonettes carregados de rails e balastro.
O resultado foi o mais saptisfatorio possivel, pois que sobrecarregada por este enorme pezo de 120,000 kilogrammas – exceptuando o das maquinas que é de 128 toneladas metricas – a ponte apenas desceu 16 milimetros, voltando sensivelmente ao seu estado natural quando as maquinas retiraram.
Seguiu-se no dia immediato a experiencia de toda a ponte, o que mais confirmou a sua solidez: ás 10 horas e 20 minutos passou pela ponte um comboyo tirado pela maquina n.º 126 arrastando deseseis vagões carregados de cal e o respectivo forgão; representando um pezo de 286 toneladas.
Esta foi a experiencia de velocidade. A machina percorreu rapidamente toda a distancia sem algum incidente, deixando verdadeiramente maravilhadas as pessoas que o presenciaram.
Este comboyo seguiu até á Estação de Pinheiro voltando pouco depois e percorrendo toda a distancia, d’ali á Estação das Devezas, sem a minima occorrencia desagradavel.
Perto do meio dia vieram as duas maquinas Marão (n.º15) e Gerez (n.º16) com os competentes forgãos representando um pezo total de 128 toneladas; 35 minutos depois vieram juntar-se-lhes as maquinas Estrella (n.º 17) e Tamel (n.º 18) cujo pezo sendo igual ao das outras duas maquinas, prefez uma totalidade de 256 toneladas ou 4,100 kilos por metro linear.
A flecha accusou aproximadamente uma oscilação de 28 millimetros emquanto ali se conservaram as maquinas, que foi no vão n.º 3 do lado do Porto.
Verificada esta mesma experiencia no vão n.º 4 a flecha apresentou apenas a oscilação de 20,m5 millimetros.
As maquinas conservaram-se ahi desde as duas horas e vinte e cinco minutos, até ás quatro horas e trinta e dous minutos; passando depois a fazer a segunda prova no vão n.º 3 do lado sul, ou da Serra.
Aqui deu a flecha 23,m2 millimetros,
D’estas quatro experiencias concluiu-se que a flecha vacilava entre 20 e 25 millimetros; e assim terminaram as provas n’este dia.
No 1.º de Novembro fi carregado o arco e o resultado foi, como era de esperar das experiencias já feitas.
D’esta maneira se levou o trabalho de exame, sendo finalmente carregada com o enormissimo pezo de 1,460,000 kilos, dando sempre as melhores provas desua solidissima construcção.


NOTICIAS GERAES



O pezo total da ponte é de 1,600,000 kilos; correspondendo só ao arco 640,000 kilos.
O numero de operarios empregados na montagem e assentamento da parte de ferro foide 150 por dia.
O projecto da ponte deve-se aos distinctos engenheiros constructores Mr. GUSTAVE EIFFEL e seu socio Mr. SEYRIG.
O systema de montagem do grande arco pertence a Mr. EMILLE NOUGUIER, engenheiro chefe de casa G. EIFFEL & C.ª e sob sua direcção foi executada por mr. MARCEL ANGEVÈRE engenheiro da mesma casa.
O encarregado dos desenhos das diversas peças foi Mr. GUSTAVE HAMELIN.
Director e representante da casa Mr. JOSEPH COLLIN.
Contra-mestres Mrs. COMPAGNON e DESTANDAU.
Os Chefs-ouvriers da casa, ao serviço de ponte foram Mrs. LACAN, MARCEL e DIOZEDE.
Guarda de armazens Mr. THEODORE BROUSSE.
Mr. SAUVESTRE architecto de casa veio expressamente de Paris para fazer uma aquarella da ponte para ser offerecida a sua magestade no dia da inauguração.
Por parte de Portugal tomaram parte ne execução d’estas obras os Ex.mos Snrs.
MANOEL AFFONSO ESPREGUEIRA, engenheiro director da companhia Real dos caminhos de ferro Portugueses.
PEDRO IGNACIO LOPES, engenheiro director dos trabalhos da 5ª. Secção dos caminhos de ferro do Norte e Leste.
BASTO, engenheiro sub-director dos mesmos trabalhos.
Os membros da junta consultiva de obras publicas encarregados por parte do governo de assistir ás experiencias da ponte foram os engenheiros os Ex.mos Snrs.:
JOÃO CHRISOSTOMO D’ABREU E SOUSA
JOÃO JOAQUIM DE MATTOS
CANDÎDO XAVIER CORDEIRO



A REDAÇÃO

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